Hoje levamos as nossas filhas à escola pela primeira vez após o isolamento. Foram quatro meses bastante intensos aqui em casa. Uma autêntica montanha russa de emoções.
Para os pais foi uma tarefa difícil. Passamos da nossa rotina mais ou menos tranquila a lidar com o HomeSchooling! Que não só se resume as dificuldades tecnológicas, e a partilha do computador com os nossos filhos (aquele em que temos todos os nossos trabalhos), quase a rezar para que não se lembrem de apagar alguma coisa importante (que aconteceu por aqui).
Foi também lidar com birras para os almoços, com discussões entre irmãos 10 horas por dia, pais a fazer de juiz de paz tentando manter o equilíbrio e a sanidade mental entre aquela gritaria toda. Até eu estava farta de ouvir-me repetir, vai lá, termina de almoçar, vai lavar os dentes (5000 vezes), baixa o volume da TV, larga o telemóvel, vai ler um bocado, termina as contas, não mandes mensagens aos amigos durante as aulas! E a inventar tarefas diárias de pintura, de atividades didáticas e divertidas para a mais pequena, fazer todos os puzzles uma e outra vez e pare de contar, enquanto parecíamos uns pequenos robôs de arrumação, o robô começava a arrumar o escritório, a sala, os quartos e quando chegava a última estação, a cozinha, e olhava para atrás, estava novamente tudo desarrumado…
Mas foram também uns meses de descoberta. De as ver crescer cada dia um pouco mais. Lá fomos fazer os riscos do quadro da altura, antes, durante e agora falta o pós vírus… (se que ele vai chegar, devemos medir várias vezes até lá). De ver como se consolavam uma a outra quando se magoavam, de as ver partilhar as suas brincadeiras, da mudança de personagens favoritas conforme o que viam na TV, (já mudaram de tema de festa de aniversário várias vezes). De ver a evolução no vocabulário e desenvolvimento da Ana, de ficar surpreendida com a evolução veloz de Eva com a tecnologia, principalmente com o computador.
As minhas filhas são autênticas heroínas! Lidaram com a quebra total da sua rotina diária, de estudar e partilhar recreios felizes, a estar sozinhos em casa sem meninos da sua idade, de ir as festas de aniversário dos amigos e divertir à brava, a mandar gif de parabéns pelo computador. De receber aulas e explicações da professora preparada a receber aulas dos pais que muitas vezes andavam perdidos entre coisas que já não lembravam. Lidaram com frustração dos pais que podem ou perderam o emprego, que têm um projeto em risco (como o caso da Glam&Sweet), entre choros e gritos, entre um vírus que bateu a porta e de repente passaram a lavar as mãos 20 vezes por dia, a usar máscara e a não fazer o que lhes ensinamos tanto: a abraçar. E sem queixar-se, adaptaram-se e mantiveram a coragem.
Hoje a minha filha mais nova, a Ana, que acordou cedo e entusiasmada porque ia para a escola, ficou num mar de pranto ao colo da educadora e, claro, a mãe chorou quase até a casa por deixar a filha após tantos meses juntas. Sentei-me no passeio com ela, e a enxugar as lágrimas da sua carinha linda e disse-lhe com amor: filha, entendo que estejas triste, eu também estou porque vou ter muitas saudades tuas e porque amo-te muito muito, mas hoje a mana não está e a mamã tem muito trabalho que fazer e eu não quero que te sintas sozinha e aborrecida em casa, e tenho a certeza de que na escola vais divertir-te muito com os teus amigos que estão cheios de saudades tuas. Mas ainda assim, ficou a chorar e eu senti-me a pior mãe do mundo por soltar a mão pequenina o meu rebento enquanto a educadora a levava sala dentro.
Então fui pesquisar um pouco sobre o tema das emoções infantis e encontrei um artigo fabuloso de duas psicólogas clínicas, Cátia Lopo e Sara Almeida. E sobre o choro elas dizem isto:
“Dizer a uma criança ‘deixa de chorar’, não ajuda, só reprime a emoção, devemos deixar chorar e libertar a emoção, no fundo, exercer uma função de suporte à dor da criança, seja ela qual for.
Por exemplo, quando uma criança chega triste, ou com medo a casa e dizemos ‘não chores’, ‘não tenhas medo’, formamos uma força de bloqueio a essas emoções e não permitimos a sua expressão. Muitas vezes, fazemo-lo para aliviar o sofrimento imediato, como se de um penso rápido se tratasse.
Embora, no imediato pareça funcionar, a longo prazo, só torna a criança numa espécie de “bomba relógio”, acabando por explodir, mais tarde ou mais cedo, com vários efeitos especiais, característicos das crises de raiva ou de traços depressivos, por exemplo.”
Eu confesso que fiquei aliviada após ler este artigo, por não ter dito a frase: filha não chores não tens motivos para chorar. Porque realmente tinha motivos, sentia a dor da separação da mãe, de sair da segurança de casa onde ficamos isolados, para o exterior onde anda o bicho maluco, porque eu também sentia essa dor, da separação, da culpa por deixar-lhe no exterior e exposta ao vírus.
Elas falam no artigo sobre as emoções da crianças e neste sentido, mencionam 5 pilares para desenvolver a inteligência emocional das crianças, que eu partilho aqui com vocês:
“1. Dar muito amor e mimo
O mimo e o amor funcionam como o combustível que nos faz mover, não só em criança, mas ao longo de toda a nossa vida. É o amor que nos prende à vida, e só quando o amor nos segura, podemos alcançar a felicidade, a segurança e o bem-estar. Mostre ao seu filho o quanto gosta dele e o quanto ele é importante. A criança irá, gradualmente, sentir-se amada, valorizada e segura de si.
O principal ingrediente para uma criança ser feliz é o amor. O amor seguro e incondicional, o afeto e o mimo. Não, não é verdade que o mimo estraga as crianças. Nunca uma criança ficou estragada por ter mimo a mais, ou por ter amor a mais!
2. Estabelecer regras e limites claros
Só com limites claros a criança cresce segura de si. É importante estabelecer balizas sem resvalar para um lado de ‘general autoritário’, sem que os pais pareçam mais assustados do que seguros. Os limites – embora na fase inicial uma criança os rejeite – atribuem-lhe segurança e robustez.
Os limites devem ser claros pois, com o crescimento, surge a necessidade de a criança descobrir o mundo à sua volta. E, não raras vezes, essa descoberta faz com que comece a surgir o ‘não quero’ e ‘não faço’; é normal e saudável que uma criança descubra o ‘não’ e lhe dê uso”.”
E eu acrescentaria, a criança pode e deve tomar as suas próprias decisões conhecendo de forma clara quais são os seus limites e as regras que os mantêm em segurança, a intervenção dos pais aqui é fundamental pois a terna idade eles não têm completa noção das consequências de decisões que tomam. Cabe a nós, os pais, ensinar-lhes e dar-lhes as ferramentas necessárias para que dentro dos limites possam decidir da forma mais sábia.
“Aos pais, cabe traçar-lhe o caminho e definir-lhe os limites, mostrar que se preocupam com ela, por isso, há limites que não permitirão que sejam ultrapassados. A congruência (ainda que, com espaço para contraditório) das regras, a disponibilidade dos pais para direcionar e apoiar a criança a gerir as contrariedades e dificuldades vão promover a capacidade de a criança expressar as emoções e de as gerir nas situações de frustração.
3. Permitir a expressão e auxiliar a traduzir por palavras aquilo que a criança sente
A criança desenvolve-se gradualmente, capacidade de reconhecer as emoções e de lhe dar um nome acompanha o seu desenvolvimento. Mas, muitas vezes, a criança, além de imatura emocionalmente, é imatura verbalmente, tendo dificuldade em expressar por palavras aquilo que sente. Expressa-se com birras, com choro e agressividade.
Cabe aos pais e educadores da criança dar nome e atribuir significado às suas emoções, sentimentos e comportamentos. É importante explicar à criança que sabe que ela está com raiva, porque teve de ir jantar sem acabar o jogo de tablet, por exemplo.
Assim a criança vai, aos poucos, aprender a comunicar o que se passa dentro de si pela palavra. Dê espaço à criança para se expressar abertamente sobre os seus sentimentos e ajude-a a verbalizar o que está a sentir.”
Não sei como foi na vossa casa, mas aqui vivenciaram-se estes momentos de raiva em que, por exemplo, a minha filha mais velha fazia cara de má e chateava-se quando eu lhe dizia que aquele texto não estava bem, quer teria de apagar e seguir as regras e fazer um texto como deve ser. Ter de ouvir isto: a professora Susana é que sabe, envia assim, não vou repetir, quando a mãe sabe que ela não tem interesse em ver as correções, tentar segurar os “cavalos” do nosso ego e dizer: filha, eu sei que é frustrante para ti repetir e acredita que eu preferiria que assim não fosse pois já digitalizava tudo e enviava de uma vez, mas eu sei que tu és capaz de criar um texto melhor, se segues as regras desse tipo de texto e as regras que a Professora deu, vais garantidamente produzir um texto melhor. Neste texto não deste o teu melhor, fizeste algo para despachar e eu não gosto disso. Sabes que temos de dar sempre o nosso melhor. (isto depois de ter respirado fundo, ido a cozinha a tirar um pano ao chão no mínimo pela vontade de fugir e largar o HomeSchooling).
“4. Falar de si e das suas emoções
É fundamental que os pais consigam falar sobre si próprios e sobre as suas emoções. Muitas vezes os pais estão tristes com uma situação familiar e limitam-se a dizer à criança que estão cansados.
Nunca negue a sua tristeza, ou frustração com alguma situação. Falar sobre si, cria uma ponte de cumplicidade com a criança, ajuda-a a identificar as emoções no outro, a desenvolver a empatia e abre uma janela para que a criança fale sobre si própria. É imprescindível fomentar o diálogo familiar.”
E belos conselhos tenho recebido das minhas filhas quando partilho as minhas emoções. Nem imaginam o sabias que são as crianças e porquê? Porque são simples, descomplicadas e objetivas!
“5. Olhe o mundo na perspetiva da criança
É fundamental que os pais se consigam colocar no lugar da criança, isto é, que consigam ver o mundo na perspetiva da criança. A maior parte dos conflitos são causadas porque cada um de nós tem uma perspetiva diferente sobre a mesma situação. Uma criança olha para o mundo de forma diferente de um adulto. Mas, muitas vezes, os pais estão tão emaranhados nas suas realidades, nas suas verdades, no seu casamento, no seu trabalho… e, esquecem-se de ver as coisas pelo lado da criança, tornam-se inflexíveis e rígidos. É importante flexibilizar e colocarmo-nos no lugar de cada criança.”
O nosso ego a falar, a criar expetativas excessivas sobre as nossas crianças, as nossas crenças e medos e frustrações. A realidade é bem diferente quando a olhamos desde lá baixo, desde aqueles pezinhos pequeninos. O que é simples para nós pode não ser para eles, e vice-versa, por isso vamos deixar a nossa criança interior falar e permitir-lhe expressar como se sente. Assim percebemos melhor aos nossos meninos.
“Se queremos uma criança emocionalmente mais robusta e mais inteligente, temos de começar por permitir que ela expresse as suas emoções, o que inequivocamente contribui para a sua saúde emocional. Caso contrário, as emoções contidas e o mal-estar, começam por inundar aos poucos a criança até que se gera a sua expressão de forma desadequada, quer para a criança, quer para a família”.
Espero que seja útil para vocês como foi para mim.
Beijinhos da Glam.
Nota: para ler o artigo completo deixo aqui o link:
Biografia: Artigo da Revista Saber Viver.
https://www.saberviver.pt/bem-estar/relacoes-e-familia/importancia-inteligencia-emocional-criancas/